sábado, 7 de julho de 2012

Meu pai, um legítimo guarapuavano de Palmeirinha

Piá duma vez, meu pai começou a trabalhar.

Hoje ele conta que a vida dura de antigamente forçava as crianças a ajudar os mais velhos, um tanto por necessidade, outro pela cultura de época.

Em seus relatos ele cita um tempo em que foi sapateiro, mais precisamente fabricante de calçados. Isso foi antes dele fazer um curso por correspondência pelo Instituto Universal Brasileiro e atuar como Guarda-Livro, esta última uma profissão de gabarito. Por último mesmo, fez carreira de escrivão.

Mas a gavolice dele em ser um sapateiro de mão cheia se deve ao fato da família ter feito piruletas para não passar fome numa época em que o meu avô foi perseguido politicamente e entre fazer umas roças, montar uma tafona de farinha de mandioca e engordar algumas safras de porcos, comprou uma sapataria.

De primeiro meu pai ia na Coletoria Federal comprar estampilhas para colar nas solas dos sapatos. Era assim que se recolhia impostos antigamente. Prá por o calçado no comércio tinha que ter selo na sola. Diz ele.

A função dele na fábrica era criar modelos e montar sapatos famininos de passear, aqueles que aturavam mais. Esses calçados davam mais lucro. Foi assim que ele comprou a aprontação pra casar.

Quando o movimento de calçados femininos diminuia ele inventava umas modas, assim criou um jogo de cinta (cinto com suspensório), que vendia muito porque ornava com o terno. Era caprichoso no último e por pouco ele não montou sua própria fábrica. Se bem que, tempos depois ele montou uma fábrica de farinha de milho, mas essa é outra história.

A par da Pernambucanas tinha uma loja de sapatos onde ele passava de vez em quando e via os novos modelos, o bodegueiro dessa loja puxava séca, queria saber das novidades da Palmeirinha, falava pelos cotovelos, e nas conversas meu pai ficava sabendo das novidades. Levava as novas ideias para a fábrica. "O problema era o couro que era adqurido em Ponta Grossa, tinha que pegar o ônibus do Mezomo e demorava muito, coisa de um dia pra ir e outro pra voltar, tinha que posar no Hotel do Schafranski", diz.

Meu avô gostava mesmo era de fazer entrega dos calçados, ele carregava a carroça com cerca de 30 pares de sapatos e pragatas e ia pros lados do Paiquerê, do Guampará, do Serro Verde, onde tinha bodegueiros que vendiam de tudo um pouco.

A minha história já começou com a fábrica de farinha, mas vi por muito tempo meus tios em suas sapatarias de consertos (essas duraram mais tempo e ainda hoje podem ser encontradas) e afinal de contas minha família desligou-se totalmente da arte do fabrico e conserto de calçados e cada descendente tomou um novo rumo. Todos saíram da Palmeirinha. Ficou a saudade.

Rui Morel Carneiro
Bancada de sapateiro - Museu Monte Sião-MG


2 comentários:

  1. Adoro as histórias do vô sobre a sapataria e o "jogo de cinta". Não nasci, nem nunca morei na Palmeirinha, mas sei que lá é o "Centro do Universo" e é terra de gente boa.

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    1. Centro irradiador de energia do Universo, Amanda! :-)

      Como sempre gostei muito.

      Abraços,
      Laurence

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